terça-feira, 22 de julho de 2008

I dream of blue

- Pai, como eu diferencio sonho e ilusão?

Tanto o sonho como a ilusão são gerados no limite da realidade - o que os difere são as origens e os propósitos.

1) Ilusão é algo irreal, sonho é algo surreal.
2) A ilusão surge da necessidade de enganar. O sonho, da necessidade de crescer.
3) A ilusão existe para privar alguém da realidade. O sonho, para alterar a realidade.
4) A ilusão está vinculada ao passado. O sonho, cria laços com o futuro.
5) A ilusão desune o pouco que se juntou. O sonho, encaixa as peças do quebra-cabeça.
6) A ilusão é pária. O sonho é companhia.

Visões romanceadas à parte, um pária nunca será feliz. Quem sonha, ao menos, tem chance.

quinta-feira, 3 de julho de 2008

Do the evolution

Tenho amigos que escrevem como sóis-de-praias, talvez por isso que preferi usar a língua inglesa (e seus anglicismos). Não será diferencial por muito tempo (e nunca foi em certos patamares), talvez por isso venha também a língua japonesa, a língua espanhola. Finalmente, a língua do P, cuja fluência torna-se aos poucos precária com o desuso, ainda me é um trunfo a ser explorado (ou, quiçá, esquecido).

Essa perspectiva lamarckiana de desuso->extinção não foi muito correta do ponto de vista evolucionário, mas se pensarmos no conhecimento, isso acaba sendo verdade. Acontece com idiomas, acontece com contos e cultura populares, acontece com linhas de pensamento, acontece com teorias astrofísicas, acontece com modos de gerenciamento, acontece com amizades. Tudo que cai em desuso acaba sendo cadencialmente extinto. Em alguns casos, demora algumas gerações. Em outros, apenas alguns meses.

Um idioma pode morrer após dezenas ou centenas de anos do seu desuso - alguns viram apenas uma relíquia histórica, ou algo a ser admirado/estudado, como o latim. Um relacionamento geralmente dura menos que isso para ser extinto.

Seja no âmbito cultural ou social, toda extinção parte de um ponto de "quebra". Seja o domínio de um povo, a queda de um império, a traição de um amigo, a frieza de um namorado. Nesse ponto, o que até então era de fato um esforço fidedigno de manter algo vivo e a ser postergado, passa apenas a uma falsa ação para esperar o fim. Mantém-se vivo para dizer que tentou, para depois poder dizer "infelizmente".
Os romanos disseram "infelizmente" a sabedoria grega aos poucos se perdeu. Os portugueses disseram "infelizmente" a cultura indígena foi quase extinta. Nossa relação "infelizmente" se esfriou e por isso acabamos.

Não posso ser radical e dizer que isso se aplica a todos os casos de extinção. Quando o ponto de quebra provoca mudanças muito radicais, a extinção não é decorrente do "efeito Lamarck". Mudanças climáticas, mortes de pessoas importantes, acidentes de trânsito - guardadas as devidas proporções, tudo isso pode gerar uma extinção imediata.

Como o tópico explorado na dissertação é a evolução, não poderia deixar de mencionar Darwin - não quero entrar na teoria evolucionista, mas apenas em uma máxima de todo pensamento: Sobrevivência do mais apto (ou do mais adaptado). Em suma, apenas aqueles que se adaptam são capazes de sobreviver - na natureza, o pêndulo dança entre vida e morte. Na sociedade, o pêndulo pode ficar entre o emprego e o desemprego, o sucesso e o fracasso, o destaque e o anonimato. A chave do pensamento não é ter capacidades mais desenvolvidas ou habilidades mais extrínsecas - trata-se da única (e variável) capacidade de nos adaptarmos.

Adaptar-se, em primeira instância, é aplicável ao seu "estado" e não ao caráter/personalidade. O seu "estado" é mutável de acordo com o ambiente. No trabalho, você pode ser sisudo e nas reuniões familiares, o piadista. Nas reuniões, usando terno. No fim de semana, bermuda. Em alguns casos, a adaptação influencia a sua essência. Mas será que é realmente adaptável ou apenas uma faceta da sua personalidade até então oculta é descoberta? Por sermos seres com diversas esferas de influência, não temos como assegurar que alguém passou a ser agressivo - apenas que ela passou a usar roupa social. O estado quando adaptado é comprovado, a mudança de essência é improvável.

Outro ponto importante a ser frisado é que, mais uma vez devido à miríade de esferas de ação de cada ser humano, há a possibilidade de uma pessoa ser "extinta" em um aspecto e ser "evoluída" em outros - no mercado de trabalho vemos muito isso, e geralmente a extinção sobrepuja a evolução.

Na vida, ficar parado não é uma opção. Só se evita de voltar, indo em frente. Só se evita a extinção, evoluindo.

Trocando em miúdos, ao meu ver, a base para sermos seres humanos em crescimento integral pode ser colocada em duas bases - uma lamarckiana e uma darwiniana:
- Uso das virtudes e desuso dos vícios
- Adaptar-se sempre

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Poslúdio

O texto que era pra ser apenas sobre evolução de conhecimento foi quase extinto. Portanto, evoluiu para uma maior gama de ação - relacionamentos, impérios, etc.
E não consegui falar das padarias que são bancas de jornal, das bancas de jornal que são restaurantes e das outras "evoluções" que vemos por ai.
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quarta-feira, 2 de julho de 2008

Addicted

Ele já havia passado do longo estado de negação - cada dia uma ferida em seu orgulho que ficou em frangalhos. Passou boa parte do tempo isolado, sentindo raiva do mundo, mas principalmente de si mesmo. Negociava com Deus, com o mundo, com os números, com os fatos. Andava nos limiares da depressão, resgatado sempre por um triz, mas deixando algo do lado de lá do muro.
Havia aprendido a aceitar, e com a aceitação veio a inerente necessidade de mudança. Ele estava cansado dos constantes esforços para mostrar ao mundo e, principalmente para ele mesmo, que era de fato alguém disposto a melhorar. "As vississitudes do renascimento", dizia ele. Paralelo a isso, residia também o empenho em não voltar ao poço de onde havia sido retirado - toda aquela sujeira demorou a ser lavada e, até hoje, muitos ainda o viam apenas como aquele que tinha caído.

O vício acaba com uma pessoa, gera dependência, confusão, inversão de valores, auto-destruição, negação de si mesmo. O vício domina, toma conta e as vezes até toma o lugar da pessoa, que se diminui, se reduz a nada comparado ao que se fora. Ao se depararem com a realidade, boa parte se entrega à auto-comiseração, auto-flagelação, depressão, baixa auto-estima, ódio-próprio. O vício é algo que destrói com maior intensidade o ego do que o corpo. Para os poucos que conseguem se livrar, uma parcela ainda mais reduzida consegue viver como mais do que uma casca reciclada cujo interior não foi restaurado.

Quando ainda pouco impressionava com suas quase-intactas habilidades de diálogo, para ele parecia apenas uma verborragia mentecapta, limitada ao pouco de sanidade que lhe restou. Ele sabia que a responsabilidade era dele, por se achar forte demais, imune demais.
Essas lembranças sempre traziam à tona o pior dele (ou nele) e acentuava os conflitos entre o seu enraigado presente e o alado futuro. O seu eu destruído e aquele que desejava renascer. Para um viciado, a luz no fim do túnel não quer recebê-lo - é uma luta contra a luz e a escuridão, um pária na batalha maniqueista. O desejo de vencer é mitigado pela pressão da derrota iminente e das marcas das derrotas anteriores. Antes mesmo que um passo seja dado, uma luta devastadora ocorre sem testemunhas e sem vencedores.

- Por que lutar por autopreservação quando falta amor-próprio?
- Porque talvez se você conseguir a autopreservação, ela puxa o amor-próprio. Algumas vezes, a solução está no caminho oposto.


A luta não é contra o vício, mas contra si mesmo. O vício corrompe, mas quem se destrói é o homem. Por isso sabemos quando devemos lutar, quando devemos esperar e quando devemos fugir. A sobrevivência não dá margem para a vergonha.
Deve-se entender que não se ruma à melhora, é apenas a jornada de volta. Só chega-se à luz quando se percebe o fato de que lá é seu lugar. Para quem sai do vício, o caminho é o oposto.


Quando de ponta-cabeça, nossos pés tocam o chão.

terça-feira, 1 de julho de 2008

The four first last

Arde o sol
e muda o ar
Ar de muda
Mar de dúvida
Fim da tarde

Arma o dia
e ama a noite
Armadilha
Mar marasmo que
Não se alarma

Leva a vida
A vi na viela
Amarela, elevada
E levada, quer, liga
Quer não - releva