segunda-feira, 10 de janeiro de 2011

Dias sem Google, mais e menos vida

Macro no micro (0)


Uma das premissas que estabeleci neste período "sem vida virtual" era o de tornar os laços reais mais evidentes. Mesmo se não fosse uma das premissas, viria a se tornar uma das realidades mais esmagadoras deste período. Cortar os laços virtuais significa depender somente dos laços reais - o que parece óbvio e até positivo, numa sociedade (e na minha vida) que a existência em ambos mundos coexiste (não tão) pacificamente, mas, em primeira instância, interdependente. Num cotidiano com pouco tempo, a vida virtual se tornou não apenas um capricho moderno, mas sim uma janela para o mundo que continua girando.

O resultado desse breve experimento e, todo o comentário subsequente a este parágrafo, deve-se a uma base paradoxal - a solidão e o companheirismo real de mãos dadas, mesmo que não concomitantes, ou talvez menos do que era num cenário da estranha relação entre o virtual e o real.


The things we do together (1)

Tudo aquilo que envolve mais que um ser humano tende a ser menos abstrato. A coexistência de pessoas arraiga com maior afinco os pensamentos e ações à realidade - salvo os cem tios e centauros que devastam sem precedentes a floresta do pragmatismo. Neste período de 40 dias, posso dizer que compartilhei com maior vivacidade meus pedaços de vida com pessoas que são mais que um resquício virtual na minha coleção de amigos-contatos.

Com ela, montei 2 quebra-cabeças. Acredito que tenha sido a primeira (e segunda) coisa real que construímos juntos. Tudo se torna mais real após o primeiro passo. Independente das dúvidas, tudo se esvai ante a certeza de quem se ama e por quem se é amado.


Com os amigos, fiz um curso de culinária japonesa. Sem contar também o Reveillon, que além de colocar em prática os dotes culinários, passei o dia com amigos e foi um dia bem especial. Isso sem contar os encontros no Fran's que persistiram de modo mais intenso. Além disso, devo também destacar a importante insistência de convites que recebo daqueles que julgo serem meus amigos, apesar de me portar sem dar a devida importância que a atitude deles representam pra mim - aquiesci a um dos convites e a recepção calorosa, os olhares misturados de surpresa e contentamento, e até as discordâncias e o ligeiro deslocamento, foram motivos de grande alegria naquelas poucas horas tão significativas.


Provavelmente, mesmo se estivesse com a mesma rotina virtual, eu teria feito tudo isso, porém com uma percepção diferente. O compartilhamento constante nas redes virtuais faz com que toda experiência se torne menos própria, menos minha e, por consequência disso, menos especial. Do mesmo modo que se compartilha a insatisfação pelo trânsito, se fala sobre eventos de maior magnitude. O ordinário se mistura com o especial na vala comum do virtual - a expressividade e a intensidade que se desenvolve de modo tão rico na face e nas ações do ser humano, na virtualidade se transcreve em quantidades de acentos, pontos e suas combinações. A vala comum do virtual é muito mais pobre e mesquinha que a do real.

Do mesmo modo, as relações virtuais são muito mais frágeis, superestimadas e falsas que as relações reais. Esta linha de pensamento pode estar embebida do tônico do egoísmo, mas não deixa de ser verdade. Nos outros, encontra-se o real valor do eu - até no compartilhar, o seu próprio eu se torna mais completo.

Não que haja novidade nas minhas palavras. O que encontrei não foi algo que se perdeu na selva áustera da modernidade - apenas revi a importância que tenho que dar àquilo (ou àqueles) que ao invés de optarem pelo silêncio no tempo distante, estenderam suas palavras a um ouvinte que não ousava depender de seu crédito.

Neste período, para o mundo e os outros, eu morri um pouco e revivi um pouco.


The things I do on my own (2)


Quando questionado sobre o motivo da minha decisão em me abster do uso das ferramentas virtuais e das redes sociais, a minha resposta era simples: "Porque eu posso." Não é meu intuito parecer arrogante, afinal, gabar-se pelo fato de não usar a internet é tão idiota que tal nível de petulância não seria aturado e, por fim, sem dúvida, regurgitado pelo meu ego falho. Propus-me passar por este período para identificar a valia de uma vida sem ramificações e destaques em um meio de maior visualização.


Morri um pouco, pois a morte virtual ocorre de modo tão rápido que em questão de dias, deixa-se de existir. Não estar no "muro" de novas postagens ou sumir da página inicial do twitter é o que basta para passar ao estado decrépito. As mensagens cessaram rapidamente e, as que recebi após os primeiros dias, são decorrentes apenas das interações não-virtuais que compartilhei com alguns amigos.


A sede por informação seguiu do mesmo modo, porém por não ser saciada pelas fontes normais do dia-a-dia, derrubou-se para outra fontes de solução mais imediadista e menos abrangente. Neste 40 dias, li cinco livros, tive que usar atlas e dicionário (bem empoeirados, diga-se de passagem) e, se tivesse em mãos um Guia das ruas, sem dúvida teria se tornado meu melhor amigo nesta quarentena.


A solidão também fez parte do dia a dia. Apesar de não sentir falta de nenhum dos sites abandonados neste ínterim (menos o Google Maps), em alguns momentos houve sim a vontade de acessar o tal do msn, mesmo que fosse apenas para olhar alguns contatos com os quais não queria conversar. Este ímpeto era agravado nos momentos de insônia. Um fato interessante, todavia, é que ao contrário do que ocorria em situações parecidas antes, me senti menos sozinho quando estava cercado de pessoas. Sempre me perdia em devaneios e análises superficiais que me distanciavam do grupo em que estava inserido no momento. Por ter poucos momentos de real interação, acredito que me empenhei em me envolver mais.


Outro fator importante é a troca que ocorreu nos momentos de falar - em alguns momentos que claramente me expressaria ou responderia uma questão, optava por ficar em silêncio por não ter o respaldo da pesquisa rápida na internet para corroborar a minha opinião. Do mesmo modo, das vezes que provavelmente ficaria quieto e procuraria a resposta nos recônditos virtuais do google, dava meu braço (ou língua) a torcer e perguntava aos companheiros ao redor para que sanassem minhas dúvidas.


Se fosse definir em poucas palavras o que esta experiência significou no ponto de vista pessoal, diria que houve um desvínculo com o que não era de fato meu. Ou seja, um vínculo maior com as coisas que normalmente seriam maquiadas pelas muletas virtuais - as dúvidas, as lacunas de conhecimento, as imperfeições. Por fim, (re)tornando-me humano, demasiadamente humano.



Conclusão (3)


Esta experiência não gerou nenhuma conclusão de grande valia, ou epifanias que se ditas mudariam o rumo da humanidade. Houve a reafirmação de coisas óbvias e a percepção da intensidade das coisas reais.


Dentre os óbvios, posso destacar dois pontos:


- Todo limite auto-imposto sem flexibilidade é nocivo;
Optar por não usar a internet em nenhuma ocasião é uma ofensa aos avanços que foram conquistados com o tempo pelo homem. Da mesma forma, depender totalmente das ferramentas criadas é o caminho mais rápido para o emburrecimento, sendo uma ofensa à nossa capacidade humana de raciocinar.

- A vida sem internet seria difícil, mas bem longe de ser impossível;
Durante os 40 dias, não houve em nenhum momento a necessidade de acessar as redes virtuais. Quanto às ferramentas de busca, apesar de em alguns momentos se apresentarem como uma opção mais fácil, não houve em nenhum momento em que foram o último (ou único recurso). A única ferramenta que precisei de fato foi o Google Maps - não encontrei nenhuma alternativa viável para montar rotas nas ruas e buscar imagens de mapas.


No ponto da percepção intensificada, por não haver o refúgio virtual, tanto a solidão como os momentos de companhia se tornam mais intensos. Como disse no item anterior, tudo se torna mais seu e menos do mundo. Não houve nenhuma mudança radical, nenhum momento "powerpointístico" de rever a minha posição, viver como se fosse o último dia e carpe diem. Mas, admito que (re)encontrei um pouco mais de mim nisso tudo. Fica, sem dúvida, a sugestão de reduzir a vivência virtual. Ou, quem sabe, deixar com que sintam saudades virtuais dos seus comentários ou da sua presença nas páginas iniciais das suas redes sociais.

Um pouco menos de você, neste cenário, se tornará um pouco mais de você. Paradoxalmente (in)conclusivo. Mas, que é bom estar de volta, não posso negar.

3 comentários:

Anônimo disse...

dude...passa uma semana com o Pablito que tu vai ver o que é uma experiência que vai mudar tua vida, hahahahaha.

Unknown disse...

Engraçado que alguns minutos antes de ler seu post, estava justamente pensando em como conseguiria fazer isso um dia, tendo em vista que meu trabalho exige que leia os emais a cada 15 minutos no minimo. Mas amei este post, vou tentar...bjú

Erick disse...

Um outro problema que tenho notado trazido pela utilização de programas de msg instantanea, é sua contaminação na hora de conversarmos com alguém. É cada vez mais difícil encontrar pessoas que consigam esperar você terminar o que tem pra dizer, para ela falar algo sem te atropelar. e vice versa. no msn, recebemos uma msg, e já começamos a digitar uma resposta, enquanto as vezes a pessoa ainda está digitando em uma outra msg a complementação daquela informação.