terça-feira, 27 de maio de 2008

Remembrance

Eu esqueci que era outono, mas quando fui almoçar hoje vi uma cena que parecia de filme. Estava embaixo de uma árvore e vi as folhas caindo, meio que em câmera lenta na rua. Mais cinematográfico ainda foi porque nenhuma caiu em mim, o sol batia de leve na rua e nenhum carro passou naquele momento. Seria digno de um Oscar se o vento tivesse agitado o meu cabelo.

Quando vi, lembrei da estação.

Eu esqueci como era sentir esperança, mas quando acordei hoje senti o coração bater. Senti de novo aquela certeza do que ainda não é (e talvez nem será). E nesse retumbar momentâneo, muito veio à tona.

Quando bateu, lembrei da sensação.

No farfalhar das folhas, no chilrear dos pássaros, no chapinhar das crianças. A sensação nostálgica daquilo que um dia se foi, os pequenos lampejos de esperança. Quando uma mensagem no celular faz o dia parecer melhor. Quando uma pequena oração, faz a vida ter sentido novamente.

Diga (a)o fraco, eu sou forte.
Tudo que se perde, se pode achar. Tudo que se esquece, se pode lembrar.

domingo, 25 de maio de 2008

Velho Mundo

Velho mundo
Que se diz novo ante ao mar
Que faz fogo ante ao frio
Que da paz se torna o maior ardil
Que faz a roda que começa a girar

Velho imundo
Mal quisto, mal visto
Que se diz esquecido
Que apesar da imundícia
Ainda revela um sorriso gentil

Velho mudo
Que preferiu se calar
Antes mesmo de proferir som algum
O silêncio funesto o envolveu e
sorumbático, tornou-se
Velho morto

sábado, 24 de maio de 2008

Outra vez

A métrica é companheira, auxilia com mão destra as palavras canhotas. Dá-lhas uma linha a seguir, as guia para suas rimas sem tirar seus espaços e determinam seus pontos, até os finais.

A métrica é mãe, gerou em seu ventre os sonetos e versos hercúleos, heróicos, hediondos e hereges. Sempre respeitando a forma, sempre inspirando as palavras a deixarem a ordem amorfa que possuem quando sós.

A métrica é rigorosa, com mão de ferro separa e nega com veemência a presença dos termos que, inocentes, tentam se encaixar comodamente nas frases da vida. A sua balança pende e seus olhos não estão vendados.

Livro sem figura, poema em prosa
Tirando acentos e vírgulas
Desconstruindo meses e dias
Tirando da ordem e tirando da vida
Esquecendo a quantidade de linhas
Deixando as contagens regressivas
Progressivas, egressivas, agressivas
Colocando as palavras se negando a rimar
Querendo que a vida seja mais que um par
de letras e fonemas que enganam os ouvidos de
quem lê em silêncio
Reneguem os acrósticos,
Agnósticos, prognósticos, pernósticos

Discordando os singular do plurais
colocando letras Maiúsculas no meio da Frase e também no fiM
Sem a autocomiseração de se culpar porque acabou assim
Em primeira, terceira, segunda pessoa porque a ordem é sua
A ordem é viver, usando as linhas apenas para expressar
aquilo que deseja de fato mudar ou manter
De nada vale usar tantas letras para juntar embaixo
do tapete aquilo que não se quer esconder
Do que se deve manter, até os tils e jotas hão de passar
Literalmente, desenvolver
Des-envolva-se de tanto explicar e busco apenas a essência
Há tanto estou assim, que rimo sem querer e vivo sem saber
Alternando linhas, parágrafos e travessões sem colocar o que
importa mesmo em caixa alta, em primeiro lugar
Negando a outrem o direito de amar a mim, alegando e justificando
pelo fato de ter sido escrito assim Basta
,recomeçar é uma frase que começa com vírgula aos olhos do mundo
.e uma que começa com ponto aos olhos do sujeito, simples

" Não pense
Que a cabeça agüenta
Se você parar (...)
Tente outra vez"

sábado, 17 de maio de 2008

Jogo da Vida

Há quem acredite que dizer que a vida é um jogo passa uma imagem de frieza e calculismo - ou apenas de falta de compromisso e ludismo nocivo e exacerbado. Eu acredito que, a grosso modo, nossa vida é uma espécie de jogo, mas como um daqueles de passar de fase.

Às vezes, as fases são consecutivas - e assim as vezes somos testados na mesma questão em "níveis" diferentes. Exemplifico:

Um rapaz que é muito "nervoso" e precisa ser mais paciente. Pode ser testado do seguinte modo - considerando como nome da fase "Nervoso->Calmo":
- Nível 1 - ser fechado no trânsito;
- Nível 2 - não receber um relatório do seu funcionário;
- Nível 3 - ouvir um monte de reclamação e;
- O chefão - levar a mulher para fazer compras na véspera de natal.

Estas são realizadas de modo "paralelo", ou em mundos diferentes. Antes de chegar ao chefão do "Nervoso->Calmo", há a primeira fase de "Tímido->Comunicativo" e uma fase bônus "Aprendendo a dançar salsa" no meio.

Obviamente, na vida sempre estamos vivendo (ou jogando) fases múltiplas que se cruzam e influenciam umas às outras - por exemplo, ser mais comunicativo pode gerar um melhor entendimento dos outros e, portanto, ser mais calmo. E por aí vai. As concomitâncias das nossas fases tornam a vida mais parecida com um jogo de tabuleiro, de estratégia. Cada movimento é uma fase e tem direta influência no todo - em alguns jogos, o primeiro movimento decide sucesso ou fracasso.

Em todos esses jogos, seja virtual ou real, há sempre um "inimigo" a ser derrotado. Uma "missão" a ser cumprida e aqueles que querem te impedir de completá-la - sejam os jacarés do Pitfall ou os cavalos e bispos do xadrez. No nosso "jogo", toda a batalha é contra nós mesmos. No dia a dia, se não há êxito é porque nós nos limitamos, nós nos derrotamos e não há celebração do vencedor.

Eventualmente, arranjamos um jeito de nos colocarmos em xeque. Em tudo que você pode imaginar - principalmente naquilo que vai de encontro aos nossos princípios. Algumas vezes, o xeque não vem para contradizer, atacar ou derrubar - a não se que seja um xeque-mate. Apesar de não saber jogar xadrez, sei que o xeque é apenas um aviso extremamente claro de que se está em perigo - e que dificilmente se sai dessa situação. Apenas exímios jogadores conseguem escapar de um xeque - para os reles amadores, resta a contagem para o fim da partida.

Tudo aquilo que você julga ser bom ou especial, será colocado em xeque para que você possa ser de fato um exímio "jogador" nesse quesito. Se você toca um instrumento, será colocado à prova quando for apresentada uma peça musical que seja quase impossível de tocar - e, como nos videogames, de nada adianta chegar no chefão e não passar. Não se fecha o jogo parando na última fase.

Há de se considerar também, evidentemente, que há algumas fases que não devemos passar - ser exímio mentiroso ou exímio traidor não o levará a lugar algum, ou a nenhum lugar que você queira realmente ir. Não encorajo o pensamento de "se não consegui é porque não era para ser" - para tudo há uma explicação, mesmo que não seja lógica e mesmo que não seja agora.

Acredito que fraco não é quem desiste vez em quando, mas sim quem escolhe "jogar" onde não é possível vencer a si mesmo ou jogar apenas "a brinca" e não "a ganha". E, no final do texto, não há uma mensagem te encorajando a não desistir. Deixo apenas:

1) A oferta de ajuda (dar aquela dica na jogada ou até trazer um "continue" quando tiver quase "morrendo");
2) O desejo sincero de que você passe apenas nas fases que tem que passar, abandonando os joguinhos (aqui no sentido negativo) da vida que mais consomem o tempo e nos impedem de focar naquilo que realmente interessa.

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Muitos parênteses e travessões, muitas explicações.
Muitas aspas, auspicioso de deixar explícito o que fora dito.
Não existe clareza em excesso.

sexta-feira, 9 de maio de 2008

Dois em um (Filosofia de bar)

Eu sou velho, sou idoso, sou vivido, sou sábio, sou cansado. Mais velho que o amor que não deixa de existir, mais velho que a dor toda que reside em mim. E que dor é essa senão o reflexo do mundo para aquilo que eu me tornei? Como um sepulcro cravejado de brilhantes, nada me resta a não ser o fétido odor da morte que me acompanha, que me envolve as entranhas, que me seduz a mergulhar no seu oceano de perdição, eterno, etéreo. E o vão entre a vida que tive e a que não vivi, a centelha da efemeridade que arrefeceu qualquer pincelada de esperança no porvir.

O hoje, que destruiu o carinho do ontem, que martelou na pedra a tristeza do amanhã. Passos na areia, pegadas no solo em que me prostro, a incerteza do certo e errado, errante. Sem oásis, sem caminho no ermo, desértico, naquilo que um dia fora chamado de alma. Vivido e não vívido, envaidecendo-se do que não mais é, alargando o vão para o que podia e deveria ser. E como enxergar congruência no que se pode e no que se deve? Como discernir a própria pegada da de alguém que fincou os pés na terra com as mesmas tristezas, puxando o mesmo pesar e regando o solo com lágrimas de dor? Como discernir tudo quando não sei discernir o que eu era do que eu sou? Uma miríade de portas que se abrem, duas pernas que se negam a seguir, dois braços que se recusam a alcançar, dois olhos que se recusam a ver, uma boca que não sabe gritar.

Mesmo velho, sinto-me um infante, um rebento. Diminuído cada vez mais pela magnitude daquilo e daqueles que me cercam. Mesmo infante, sinto-me como um velho que não consegue mais enxergar as mudanças da vida. Busco a ilusão de empurrar o amanhã, isolando-me na ostra, refugiando-me na minha torre de marfim, nefelibata - caminhando e escondendo-me nas nuvens. A insônia torna-se parceira do meu cotidiano junto à solidão e as noites não-dormidas servem-me apenas de motivo para arrependimento quando o sol raia mais uma vez, para fazer nascer o desespero e abortar a esperança ainda prematura, de (não) viver mais um dia como o anterior.

Como é aquele orgulho de ser o que se quer, aquela dor de não ser o que se deve? Sentidos opostos que, a tristeza de um não afeta o contralateral. Aquilo que se vê com olhos perspicazes, pode não ser o que a realidade desdobra. E desdobra, cai, espatifa. Recolhe, espana, dobra e guarda. Disfarçada e deliberadamente se mente pro ar, esgana-se o coração e a garganta ganha um nó de melancolia bem apertado.

Infante, infâme, buscando justificar ao meu próprio mundo tudo que fiz e deixei de fazer. Quando a esperança se foi, levou consigo as cores, os amores. Restou-me o sonho para o qual minha razão exclama-me: disparate! De deitar-me em minha cama e que aquilo que um dia tive por certo, possa voltar, ao menos, a ser.

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Co-escrito com a srta. Flávia Soares.

terça-feira, 6 de maio de 2008

Vogais - Cinco

1) O O é o ultimato.
2) Em um oásis, encontro uma ocarina oriental - estou órfão.
3) As opções orientam uma existência ousada. Oxalá eu acerte.
4) Olhadelas, ósculos, outono, o oceano ondula.
5) Em órbita, aposto o oposto, orquestrando a ordem e origamizando o ostentoso eu.

Ocultamente:
Oscilante, ofensivo
Obtuso, ocioso
Ofuscado, obsoleto
Odiado

Ocasionalmente:
Obstante, obsceno
Ofegante, obnóxio
Obstrutor, objetivo
Omisso

Oficialmente:
Ofuscante, observador
Obreiro, original
Organizado, ostracista
Ovacionado

segunda-feira, 5 de maio de 2008

Vogais - Quatro

1) O U é o Ômega.
2) Uísque, úberes, um ano inteiro exilado.
3) Ouvidos aberto, ouço o oceano exclamar, úmido e undíssono.
4) Abro uma urna, extraio uma úlcera, ando em umbrais.
5) Um (in)equívoco, eu.

Ultimamente:
Ultrajado, unido
Ubiqüista, usado
Ultimanista, ultrôneo
Urbano

Utopicamente:
Ufano, umbrívago
Uniforme, unilateral
Universalista, universitário
Unívoco

Unanimemente:
Unissonante, urgido
Urbano, usufruidor
Único, útil
Ungido

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Glossário:

Ultrôneo - Espontâneo
Umbrívago - Gosta de andar pela sombra
undíssono - Que soa como o mar, ondas.
Univoco - Que possue apenas um significado.

sexta-feira, 2 de maio de 2008

Vogais - Três

1) O E é o andamento.
2) Outra emboscada, embarquei em uma errada. Ambígüo, escapei.
3) Ante ao epíteto informado, escolho evadir.
4) Elenquei os itens elementares: o obtido é uma ensudercedora exclamação incompreensível.
5) Enfim, o entitulado e inteligível eu.

Excessivamente:
Ensimesmado, empírico
Efêmero, extremista
Entorpecido, etéreo
Etcetera

Evidentemente:
Encanado, eclíptico
Eclodível, edificador
Eterno, eletivo
Especial

Esperançosamente:
Eucrásico, essencial
Elevado, embaixador
Enamorado, emérito
Extraordinário

quinta-feira, 1 de maio de 2008

Vogais - Dois

1) O A é o início
2) Anteposto ao enfim, alheio à existência outrora importante.
3) Antes experimentava até estafar o indicador escolhido.
4) Até amanhã - antes eram apenas abanos efusivos
5) Eis, assim, o incólume e incomovível eu.

Ambiguamente:
Ansioso, abdicado
Abençoado, aborrecido
Aceito, abandonado
Austero

Anteriormente:
Ascendido, apegado
Apaixonado, aguerrido
Admirado, aliado
Anjo

Auspiciosamente:
Amigo, abnegado
Assiduo, alegre
Agradecido, artista
Avivado.

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Eis o anseio existente em um ente ensimesmado, ouçam o apelo ecoando estridentemente:
"Escolha a inicial, evolua a análise e aproveite o insumo obtido - até outra avaliação."