segunda-feira, 8 de junho de 2009

Risco, Expectativa e a Curva de Gauss

Pode-se dizer que a relação entre expectativa e risco é como uma curva de Gauss. Considerando o eixo X como a variação de risco. Quanto menor o risco, maior a chance de se concretizar - logo a expectativa é menor. O mesmo ocorre do lado oposto - o risco é muito grande, a chance de se concretizar é reduzida, então a expectativa também se torna menor. Agora quando o risco está naquela região em que o risco é intermediário (ou talvez desconhecido, mas deste modo o gráfico não se aplica), é quando a expectativa chega ao seu ápice.
Por exemplo, ninguém cria uma grande expectativa ao jogar na mega-sena. Agora a cada número correto no resultado, a expectativa aumenta porque o risco inevitavelmente diminui.


Este ápice de expectativa também é o momento ideal para ação (e reação), o ponto mais eficaz. Por exemplo, em uma transação comercial, após alguns avanços na negociação há aquele momento em que, como diria Kafka, não há mais como olhar pra trás, não há volta. Neste exato momento, que seria o ápice da expectativa, a tendência da negociação ter maior satisfação e lucro é muito maior. Todavia, se este momento se perde, o risco acaba caindo cada vez mais para o comprador (e aumentando para o vendedor), e a negociação pode acabar nem acontecendo.
Há o receio de algo novo, mas teme-se ainda mais o retorno de algo antigo. Por isso, quando a situação enfrentada é recorrente em insucessos, mesmo que com participantes diferentes, a tendência é buscar uma posição alheia à tudo, isentando-se da expectativa e também das responsabilidades. Mas isso também faz com que crie uma distância do equilíbrio.

Para que a relação mantenha-se aquecida, deve-se sempre criar situações em que a expectativa exista, trabalhando para que chegue a esse ponto de equilíbrio e agindo no momento certo. Perceber este momento, o que se deve e o quanto se pode fazer tem que ser feito por intermédio da vida e não pela omissão dela. Outro fator básico é que com o passar do tempo no relacionamento, as situações criadas tendem a possuir menor impacto na situação como um todo - um problema no primeiro negócio fechado pode fator decisivo para a falha em estabelecer o relacionamento, mas se o mesmo erro ocorre após 10 anos de parceria, a tendência é de que o impacto seja menor. Não obstante, o "resultado" também se torna menos impactante com o passar do tempo.

No mundo corporativo, essa teoria dificilmente sofre grandes variações. Enquanto o resultado é atingido, não encontramos muitos pontos fora da curva. Agora quando a nossa análise se foca no fator humano, as coisas tendem a ficar um pouco mais complicadas. O ser humano está em constante mudança e, do mesmo modo, também estão as suas expectativas e percepção de risco. A nossa curva de Gauss não muda, mas o nosso posicionamento no eixo X é muito delicado e o momento de ápice, certas vezes, dura apenas alguns segundos.
Outra questão válida de destaque é a percepção instintiva de atuação em relação ao impacto. A tendência é priorizar eventos em que o impacto seja maior e desconsiderar aqueles cujo impacto não seja tão grande. Por exemplo, dificilmente chega-se atrasado a uma reunião com um cliente ou ao primeiro encontro, pois o impacto pode ser severo. Agora não é surpresa se ocorra um atraso ou até um cancelamento de última hora lá no décimo ou vigésimo encontro/reunião. Por entender que o impacto não será decisivo, a reação se torna sem empenho. Como tudo na existência humana, tudo está intrinsecamente ligado ao tempo.

Tentando explicar um pouco das decorrências de cada etapa, separa-se em três tópicos:

1) Variação na percepção
Com o passar do tempo, a nossa percepção de risco sofre mudanças que diretamente influenciam na expectativa gerada. Algumas situações começam a se tornar menos arriscadas (como andar de bicicleta para um adolescente), outras se tornam mais arriscadas (como andar de bicicleta para um idoso) e, em ambos os casos, encontrar o ápice da expectativa (andar sem cair) se torna mais difícil. Para o adolescente, não há porque se esperar o óbvio. Para o idoso, não há porque arriscar quebrar a bacia. Isso não vem apenas com o decorrer do tempo, mas também com o acúmulo de responsabilidades e com a maturidade. Isso faz com que o ser humano se torne mais equilibrado, mas também menos suscetível a criar expectativas, independente de quão impactante seja o evento - seja andar de bicicleta ou comprar um iate.

2) Seqüência de eventos gerando falta de empenho
Como mencionado anteriormente, a tendência de priorização de ação está diretamente ligada ao impacto que isso terá. Com o decorrer do tempo, o impacto dos eventos em uma relação reduz. O instinto possui uma percepção imediatista, por isso a análise não contempla, em primeira instância, histórico ou a posição de terceiros. Sendo assim, há um declínio no empenho na percepção do momento de expectativa e também em agir em conformidade. O impacto é menor, porém há grande possibilidade de que os eventos de insucesso se repitam com maior frequência gerando um acúmulo de impactos, culminando eventualmente em uma implosão do relacionamento.
Enquanto um impacto é capaz de exigir uma grande recuperação, dificilmente se volta de um acúmulo de impactos, pois quando o resultado vem à tona, a estrutura já está comprometida. (Quando todas as suas falhas são lembradas com detalhes vívidos no dia em que você deixa de levar sua mulher pra jantar pra jogar bola com os amigos, pode ser tarde demais.) Em suma, há a necessidade de domar nosso instinto e criar uma disciplina para considerar o impacto dos eventos em terceiros.

3) Adaptação à vida de baixo impacto
Um amigo certa vez disse: para que as coisas funcionem, o coração tem que bater em um ritmo diferente. É esse novo bater no peito que faz com que se aprenda a apreciar os eventos de baixo impacto - e não é uma adaptação fácil.
Não digo apenas pelo fato de os mais 'sábios' conseguirem atingir suas expectativas com suas hortas, em passar um dia inteiro sentado na varanda ou por andarem no parque. Em alguns dos casos, isso ocorre principalmente por fatores físicos - busca-se baixo impacto, pois se passa a ter menor resistência. Não que haja problema com isso, mas analisando da perspectiva de alguém de 25 anos, essa vida de baixo impacto é algo fora do comum.
Em um relacionamento, os eventos isolados começam a ter impacto reduzido, é natural. Os encontros mudam menos o relacionamento, a cada aniversário há menos para se conhecer da outra pessoa, a cada almoço em família há mais naturalidade e menos expectativa.
Não acho que a saída é se tornar um entusiasta da alegria, parecendo dopado com ácido lisérgico achando tudo lindo e rindo para as árvores. Mas sim aprender aos poucos a conviver nesse ambiente de baixo impacto, empenhando-se para que os aniversários, as bodas, as datas festivas e também o dia-a-dia sejam encarados com seriedade, atentos aos potenciais impactos acumulados. Eventualmente, o empenho se tornará apreciação.

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A quantidade de eventos de grande impacto ainda é bem alta para os que estão entre os 20-30. Encontrar um bom emprego, comprar uma casa, constituir família, fazer cursos, viagens. Cada um com sua curva de Gauss, alguns concomitantes e impedindo a ação em tempo oportuno para todos. Cada escolha elimina diversas alternativas, cada evento finca uma nova raiz no chão.

Um comentário:

Mikhailovitch disse...

Posso terminar um relacionamento porque ja não tenho mais a emoção de expectativas?